Parábola dos peixes bons e ruins (Mt 13:47-50)
Essa parábola solene forma um par com a
que lhe é similar: a do Trigo e do joio. Ambas mostram o bom e o mau, no
princípio, lado a lado e, em seguida, separados; ambas foram explicadas por
Jesus nessas palavras: "Assim será na consumação do século"; ambas
dizem respeito ao trabalho dos anjos que separam os ímpios dos justos; ambas
registram a condenação do ímpio e o "fogo", onde haverá "pranto
e ranger de dentes". Cada uma dessas parábolas contém esse fato central
que as distingue das outras a tal ponto que poderíamos ser levados a esperar
que Mateus as colocasse juntas, como ele fez com a da Mostarda e a do
Fermento; a do Tesouro escondido e a da Pérola de grande valor. Contudo, há
diferenças que devem ser observadas entre a do Trigo e do joio e a da Rede. Na
primeira, a cena acontece na terra; na segunda, a cena é o mar; mas em ambos os
casos o mundo está envolvido. Ao serem consideradas um conjunto, essas duas parábolas ensinam duas importantíssimas
verdades, pois mostram que na Igreja conhecida o bem e o mal convivem juntos; e
também que o tempo da separação já foi estabelecido. Assim os bons podem
regozijar-se, pois têm em vista o seu futuro brilhante e eterno. Os maus devem
gemer, porque, se morrerem nos seus pecados, estarão condenados eternamente.
Provavelmente a Parábola da rede foi
transmitida por último, nessa série de sete parábolas, por focalizar a atenção
no final da dispensação da graça, na consumação de todas as coisas e no
julgamento. A ênfase nessa parábola não está no usar e no puxar a rede, mas na
"consumação do século". Após relatar a parábola, em termos tão familiares
aos seus discípulos, Jesus disse que o reino dos céus será assim, quando,
em sua consumação, no momento em que a rede for recolhida, a separação
acontecerá. Como as outras três parábolas anteriores, essa sétima foi entregue
a homens de fé que o Senhor introduziu nos assuntos internos e ocultos do seu
reino. Claro que não seriam olhos humanos que os veriam, mas da perspectiva do
conselho divino. Podemos analisar a parábola dessa forma: a rede, o mar, os
pescadores, os peixes e os anjos:
1. Rede. O termo que Jesus usou para rede,
singularmente apropriado para a parábola proferida no mar da Galiléia, denota
uma rede grande, larga, pesada como chumbo, feita para varrer o fundo do mar
e trazer à tona peixes de todos os tipos e em grande quantidade em suas malhas.
O simbolismo da rede é evidente e facilmente compreendido por todos.
Representa a proclamação e a apresentação do evangelho da graça redentora, para
colocá-la sob a responsabilidade dos homens. A capacidade da rede de fazer uma
varredura larga e coletar muitos peixes ilustra o alto alcance e a efetividade
da ação do evangelho, pelo qual os homens são conduzidos a professar
o cristianismo e a participar da irmandade da igreja visível de Cristo. Para
referências sobre a rede veja Jó 19:6; Salmos 66:11; Eclesiastes
9:12. Cumming diz o seguinte: "As ordenanças, a pregação do
evangelho, suas ministrações e os seus meios de graça constituem e
são facilmente reconhecidos como a rede em toda a sua abrangência [...] não há quem esteja em lugar tão profundo que ela não
o busque; nem tão acima que ela não o alcance; nem tão mau que seja lançado
fora; nem tão bom que não seja apanhado. Ela apanha a todos, bons e maus".
Dessa forma esse tipo de rede aponta
para a varredura do reino de Deus levada a efeito nesse momento. Traz à luz a
providência de Deus e passa através de toda essa dispensação, enquanto existir
esse momento da eternidade que chamamos de tempo, até que aconteça a separação
eterna dos ímpios dentre os justos. Essa presente dispensação da
graça, iniciada no Pentecostes, e que terminará com o segundo advento de
Cristo, é muitas vezes apresentada como "o reino dos céus" (Mt
11:12). A rede do evangelho é arremessada ao mar aberto, sem distinção de
condição, clima, casta ou credo. Durante
esta dispensação, "Deus não
faz acepção de pessoas" (At 10:34,35).
2. Mar. O mar nessa parábola representa toda
a massa caída da humanidade. "Mas os ímpios são como o mar agitado que
não se pode aquietar, cujas águas lançam de si lama e lodo" (Is
57:20,21; Dn 7:3; Ap 13:1). Os homens vivem em um abismo tão negro de
pecado, erro e cegueira! Contudo, ainda podem ser resgatados pelo
Espírito de Deus, à medida que aceitarem os termos do evangelho. Arthur Pink afirma
que o mar são as nações gentílicas, porque, nessa presente dispensação, a
misericórdia de Deus é dirigida aos gentios. Mas o mundo que Deus ama, inclui
todas as almas, sejam judeus ou gentios, porque o mar do mundo é composto de
ambos. Não há dúvida que a maioria dos peixes apanhados pela rede seja os
gentios. Em termos de comparação, são poucos os judeus salvos. O Trigo e O Bom
Peixe são compostos de ambos, gentios e judeus regenerados. Em Cristo não há
judeu nem gentio. Ambos são um.
Somos informados que a rede, quando
jogada dentro do mar, não trazia todos os peixes, mas juntava apenas alguns de
cada espécie, para trazê-los à tona. A parábola nos ensina com isso que, embora
tão glorioso evangelho seja pregado, ele não faz com que todos que o ouvem sejam
trazidos para a Igreja de Cristo. Há sim um ajuntar e congregar de alguns
"de toda tribo, e língua, e povo e nação" (Ap 5:9). A palavra ajuntar
é aplicada na Bíblia para ambos: bons e maus. Sobre os bons é dito:
"Recolherá os cordeirinhos" (Is 40:11); "Com grande
compaixão te recolherei" (Is 54:7); "Reunir em um só corpo os filhos
de Deus" (Jo 11:51,52); "Congregai os meus santos" (SI
50:5). Sobre os maus é dito: "Não colhas a minha alma com a dos pecadores"
(SI 26:9); "São apanhados [...] se queimam" (Jo 15:6);
"Ajuntai-vos, e vinde, todos os povos em redor [...] suscitem-se as
nações [...] Me assentarei para julgar" (Jl 3:1-16).
3. Pescadores. Os discípulos compreenderam
plenamente a implicação dessa parábola transmitida por Jesus. Quando ele os
encontrou, muitos deles lançavam ou consertavam as suas redes, porque
"eram pescadores". Depois, ao chamá-los para o ministério, não lhes
havia dito Jesus: "Fá-los-ei pescadores de homens"? Quando arremessassem
ao mar a rede do evangelho, eles apanhariam homens vivos. Não é esse o dever
de todo aquele que experimentou o poder salvador de Deus? Tirados para fora do
mar do pecado, têm o privilégio de tentar resgatar outros. Todos os que foram
perdoados deveriam ser pescadores. Os ganhadores de almas são os pescadores de
Deus. "Os pescadores estarão junto dele; desde En-Gedi até En-Eglaim haverá
lugar para se estender as redes" (Ez 47:10); "De agora
em diante serás pescador de homens" (Lc 5:10).
Na parábola anterior (Mt 13.46) não a
lição 12, Jesus está diante de nós como o comerciante em busca de belas
pérolas. Ele é o principal trabalhador que reúne em torno de si os santos
durante essa dispensação; mas a parábola à nossa frente nos ensina a verdade
que, em sua graça paternal, ele não opera sozinho. Ao mesmo tempo que é
completamente verdade que Cristo por si só pode salvar as almas, contudo ele
nunca o faz sozinho. Ele usa os santos para salvar outros. É por essa razão que
na Parábola da rede o pronome é mudado. Até aqui tinha sido "ele",
"O Filho do Homem" e "O Comerciante"; porém agora não é
mais ele, mas eles. "Eles encaminharam-se até à praia". Essa é a
primeira vez que temos o pronome eles nas parábolas. Não somos privilegiados
em trabalharmos junto com Cristo? No milagre da água transformada em vinho, ele
disse aos serventes: "Enchei de água essas talhas"; "tirai
agora, e levai". Ao alimentar os famintos, Jesus não deu o pão à multidão
diretamente de suas mãos. Ele o concedeu primeiramente aos seus discípulos, e
então disse: "Dai-lhes de comer". Da mesma forma, os seus servos
consagrados são os pescadores que ele usa para apanhar peixes. Que nunca O
desapontemos!
É impossível que não notemos que a
posição reservada aos pescadores é discreta. Jesus não os menciona pelo nome,
mas simplesmente refere-se aos mesmos como eles. Os participantes na
obra de lançar a rede ao mar são mantidos incógnitos. Que censura para o culto
ao pregador de hoje em dia! (ICo 3:4). "Nem
o que planta é alguma coisa, nem o que rega". O instrumento nada é. Ele,
Jesus, é tudo. O seu tesouro está em vasos terrenos para que toda
a glória possa ser dele. João Batista exemplificou esse conceito
quando disse sobre Jesus: "É necessário que ele cresça e eu diminua".
Outra característica desses pescadores é esta: embora soubessem que a rede
juntaria peixes "de todo tipo", eles separavam os bons dos ruins. Não
havia dúvida com relação à sua habilidade o fato de que a rede traria uma
mistura de tipos diferentes de peixes. Estando aquela carga toda em segurança,
lemos que eles "se assentavam" na praia, o que mostra que a tarefa de
seleção e separação dos peixes bons dentre os ruins exigia tempo, cuidado e
deliberação. Em seguida eles jogavam fora todos os que não prestavam, enquanto
que os peixes bons eram guardados em vasilhas. Certamente a aplicação de
tudo isso é evidente. Ao mesmo tempo que pregamos o evangelho a toda
criatura, é propósito de Deus que busquemos bons peixes. Em conseqüência de um
esforço evangelístico, podem surgir crenças diversas e, no entanto, o ganhador
de almas, guiado pelo Espírito, estará habilitado a detectar quais serão os
bons peixes e encaminhá-los para os utensílios próprios, que podem estar aqui e
representam a comunhão entre os irmãos em Cristo. Enquanto a seleção
é necessária, como na edificação de um centro de adoração, ministério e
comunhão cristã, o julgamento não é exercido sobre os maus. Somos responsáveis
apenas pela separação, não pelo julgamento que acontecerá no futuro e será
efetuado por Deus.
4. Peixe. A parábola diz que os peixes eram de
"todo tipo", "bons" e "ruins". Habacuque talvez teve essa
sensação de mistura, quando considerou os imundos e oprimidos mais justos do
que ele próprio: "O inimigo a todos levanta com o anzol [...] por isso ele
se alegra e se regozija. Portanto sacrifica à sua rede, e queima incenso à sua
varredoura, porque com elas se enriqueceu a sua porção, e é copiosa a sua
comida" (Hb 1:15,16). Os pescadores, é claro, não poderiam avaliar o tipo
de carga contida na rede, ao puxá-la, até que essa estivesse sobre a praia, e
os peixes fossem selecionados.
Bons e ruins na rede nos leva de
volta ao trigo e ao joio que crescem juntos e são misturados um ao outro.
Enquanto essas parábolas simbolizam a igreja visível, a mistura de salvos e
perdidos dentro do cristianismo professo faz com que aqueles que buscam
encontrar uma Igreja visível e perfeita sejam levados a um grande
desapontamento. Havia um Cão na
arca, um Judas entre os apóstolos; Esaú e Jacó ainda lutam dentro do ventre da
igreja visível de Cristo. Nem todos os que estão de Israel são de fato
israelitas. Muitos dizem ser cristãos; porém não o são realmente. Pertencer a uma igreja visível não inclui alguém,
necessariamente, no rol dos membros da Igreja verdadeira. As
pessoas podem ser religiosas, contudo não regeneradas; batizadas, contudo
jamais foram lavadas no sangue de Cristo; professarem a fé Cristã, contudo não
possuí-la (Mt 7:21). A despeito de afiliações e desejos religiosos, se o
coração estiver destituído da graça de Deus, a alma estará perdida. Há apenas
dois tipos de peixe: o bom e o ruim. Se não somos trigo de Deus, somos com
certeza joio de Satanás.
Por peixes bons devemos entender os
que eram sadios e podiam ser comercializados; espiritualmente representam os
que pertencem ao Senhor e, por sua vez, são bons e praticam o bem. Por peixes
ruins podemos visualizar os mortos e putrefatos; podres, não serviam como
alimento. Malcheirosos e sem valor, foram atirados fora. A expressão por
tantas vezes usada na Escritura, "lançado fora", denota um estado
de condenação. "Lançado fora da presença de Deus" expressa uma
intensidade tal de sofrimento, dor e separação, que nada mais pode ser
comparado a isso. Quanto à qualidade do bom peixe um poeta antigo escreveu:
Pescador de homens
mortais,
aqueles que são os salvos
Sempre o peixe santo
Do bravio oceano,
Do mar de pecado
deste mundo,
Pela doçura de tua
vida, Tu os atraíste e arrebataste.
5. Anjos. Através de toda essa dispensação da
graça, o Espírito Santo opera ativamente na formação da verdadeira Igreja, a
Noiva de Cristo, e os que lhe pertencem, como pescadores, ocupam-se da rede do
evangelho. Mas, no encerramento dessa dispensação, que terá o seu
término no retorno de Cristo para receber os que são seus, ele tomará para si
todos os peixes bons, ou trigo, e deixará para trás todos os peixes ruins e o
joio. E quando Cristo aparecer na terra como seu justo Senhor e Rei, um
ministério angelical entrará em vigor e a ação acontecerá de forma totalmente
inversa. Em vez do bom ser tomado e o mau deixado, o imundo será
removido e o justo deixado, para que usufrua do prazer do reino milenar do
Senhor.
A declaração da execução de um
julgamento completo, final e eterno está registrada em forma solene: o Filho do
homem "limpará a sua eira [...] queimando a palha com o fogo que nunca se
apagará" (Mt 3:12). Quando a separação entre o precioso e o vil for
levada a efeito e o inútil for atirado dentro da fornalha de fogo, onde haverá
choro e ranger de dentes, quão aterrorizante será a porção dos imundos!
Crisóstomo classificou a Parábola
da rede como "parábola terrível". Gregório, o Grande, disse sobre ela
que o mais correto seria "tremer na sua presença que explicá-la". Se
essa terrível ótica estivesse pelo menos evidente aos nossos olhos, como estava
para o nosso Senhor, certamente nos sentiríamos imperativamente compelidos a
advertir o imundo a escapar da ira vindoura. É de lamentar que não nos
impressionemos o suficiente com o fato do surgimento da completa separação
entre os salvos e os perdidos. Sabemos com certeza que a meticulosidade a ser
usada nesse ato será exata. Os anjos não cometerão enganos ao distinguir entre
os bons e os maus: "Mandará o Filho do homem os seus anjos, e eles
colherão do seu reino tudo o que causa pecado e todos os que cometem
iniqüidade [...] Então os justos resplandecerão como o Sol, no reino de seu Pai"
(Mt 13:41,43; Dn 12:3).
Esse julgamento tão seletivo, a que
muitas parábolas se referem vivamente e sempre esteve na mente de Cristo, é repetido
sete vezes, com ênfase extrema, repetição essa para significar que tal
proposição é "determinada por Deus, e ele se apressa a fazê-la" (Gn 41:32):
Na Parábola do joio, a separação é
entre o trigo e o joio;
Na Parábola da rede, a separação é
entre peixes bons e ruins;
Na Parábola das bodas, a separação é
dos convidados que tinham as vestes núpcias;
Na Parábola do servo, a separação é
entre servos bons e maus;
Na Parábola das dez virgens, a
separação é entre virgens sábias e tolas;
Na Parábola dos talentos, a separação
é entre os servos dedicados e os negligentes;
Na Parábola das ovelhas e dos bodes, a
separação é entre os dois tipos de animais.
Devemos ter e manter em mente que a
separação final entre os bons e os ruins não aconteceu na praia. O joio é
deixado confinado no campo e os peixes ruins são lançados fora da rede e
deixados na praia. A separação, agora, é necessária, mas não observada como
deveria. A execução da separação final e do julgamento é outra história. Os
pescadores não têm nenhuma relação com isso. No final dos tempos os anjos
surgirão e separarão os imundos dentre os justos; não os bons dentre os maus,
como os pescadores fizeram. Os anjos, na Parábola do trigo e do joio e na
Parábola da rede, estão ocupados apenas com os imundos.
Não estamos tratando suficientemente
da revelação bíblica sobre o ministério angelical. Tal tratamento pode ser
encontrado na obra desse autor O Mistério e o Ministério dos Anjos. Essa é a
dispensação do Espírito, o período em que ele está ativo como agente divino
e, no entanto, "há anjos que pairam ao redor" e, no final dessa
dispensação, novamente intervirão na vida dos homens, tal como fizeram no
passado. No presente, os anjos ministram aos herdeiros da salvação, mas o dia
chegará quando eles cumprirão a rígida tarefa de separar os imundos dos
justos, e lançá-los-ão dentro da fornalha de fogo. Assim expressou Butterick:
"O espectro de sua doutrina é composto de cores escuras e claras".
Portanto, esse assunto está claro. Os
anjos serão os agentes da separação final. Agora, como pescadores, espalhamos
a rede; os anjos farão a seleção.
Juntamos todos, e os convidamos para que venham, bons e maus; os
anjos, de acordo com a palavra de Cristo, separarão os maus dos justos e o joio
do trigo.
Por fim, o Senhor, ele somente, decreta
a condenação. Nossa função no presente, como pescadores, não é a de julgar, mas
de declarar. E nossa tarefa proclamar a Cristo e sua salvação e atrair a
todos, indistintamente, para a sua cruz. Ao mesmo tempo cumpre a nós advertir
os pecadores sobre o Trono Branco que determinará qual será a porção e a condição
eterna dos perdidos. Então nenhuma rede será lançada na praia, no dia do Juízo
Final. Agora é o dia da graça, quando o perdido pode ser salvo, mas o último
júri será o tempo em que a condenação, já emitida, será ratificada.
Que o Senhor nos habilite a espalhar a rede da salvação e a convidar a todos os
homens que se arrependam e creiam, a fim de que Cristo seja o Juiz de toda a
terra e com justiça faça separação entre bons e maus, no tempo que já está
estabelecido!
fonte Bibliografia Lockyer
ebdareiabranca.com
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