Gunnar Vingren e Daniel Berg: os pioneiros evangelistas das Assembleias
de Deus
Da Suécia para os Estados Unidos e
daí para o Brasil Gunnar Vingren e Daniel Berg nasceram
em uma época difícil na história da Suécia. Entre 1867 e 1886, quase 450 mil
suecos deixaram o país por causa da escassez de alimentos e de empregos. A
maioria imigrou para o meio-oeste dos Estados Unidos.
Era a chamada “febre dos Estados
Unidos”. Embora a situação tivesse melhorado, Daniel viajou para lá em 1902,
com 18 anos, e Gunnar, no ano seguinte, com 24. Os dois se conheceram em uma
igreja sueca em Chicago, no ano de 1909, dez anos depois da morte do famoso
evangelista Dwight L. Moody, que viveu naquela cidade. A essa altura, Gunnar já
tinha feito teologia em um seminário batista sueco e pastoreava uma igreja em
Menominee, no Michigan, e Daniel trabalhava em uma quitanda em Chicago. Em uma
conferência realizada na Primeira Igreja Batista Sueca de Chicago, Gunnar
passou pela experiência do chamado batismo com o Espírito Santo e falou em
línguas. A partir daí, começou a pregar a doutrina pentecostal; porém, metade
da igreja de Menominee não o quis mais como pastor. Assumiu, então, o pastorado
de outra igreja batista sueca, dessa vez em South Bend, na fronteira de Indiana
com Michigan, e a transformou em uma igreja pentecostal. Uma de suas ovelhas
era Adolf Ulldin, que, pouco depois, anunciou-lhe o que ouvira da parte de Deus
a respeito de seu ministério além-mar. Por inspiração do Espírito Santo, Daniel
foi visitar Gunnar em South Bend e ali ouviu a mesma profecia, que também foi
dirigida a ele. Em obediência à orientação recebida, ambos viajaram para Nova York
e lá encontraram, de fato, o navio Clement, que sairia na data indicada por
Adolf: 5 de novembro de 1910. Por falta de recursos, compraram uma passagem de
terceira classe. Duas semanas depois, com miseráveis 90 dólares no bolso,
desembarcaram em Belém do Pará, sem saber uma palavra em português e sem alguém
para recebê-los no porto. Assim começou a obra das Assembleias de Deus no
Brasil.
Verão de janeiro a dezembro
Enquanto as denominações protestantes
históricas começaram seu trabalho na região Sudeste (congregacionais,
presbiterianos, metodistas e salvacionistas), no Rio Grande do Sul (luteranos e
episcopais) e na Bahia (batistas), a Assembleia de Deus começou no extremo
Norte do país. Os missionários pioneiros eram todos suecos, ao contrário do que
acontecia da Bahia para o Sul, onde quase todos eram americanos e britânicos.
O Pará é 2,7 vezes maior que a
Suécia, que tinha, na época, mais de 5,5 milhões de habitantes. Em vez das
precisas quatro estações, com as quais estavam acostumados, Gunnar e Daniel
encontraram aqui um verão contínuo. Na Suécia, eles adoravam participar da
festa que celebrava a volta do verão, entre os dias 19 e 26 de junho, dançando
a noite toda ao redor de mastros com enfeites coloridos. Os dois jovens
missionários chegaram ao Pará exatamente quando começou o declínio da economia
na Amazônia, devido à queda da produção de borracha, provocada pelos mercados
asiáticos.
Gunnar e Daniel eram muito diferentes
no aspecto físico e nos dotes pessoais. Cinco anos mais jovem, Daniel tinha
muita saúde e resistência física. Era “um ganhador de almas incomum”, como diz
Geziel Gomes. Praticava com sucesso a colportagem (venda de Bíblias) e o
evangelismo pessoal de casa em casa, quase de ilha em ilha, e “de enfermaria em
enfermaria”, quando já tinha 78 anos e estava internado em um hospital na
Suécia. Além da mala cheia de Bíblias e folhetos, carregava sempre o violão, ao
som do qual cantava hinos em português e em sueco para evangelizar. Em
compensação, Gunnar era mais preparado e se tornou, naturalmente, o líder do
trabalho. Ele era quem mais pregava, quem mais batizava e quem ia consolidando
e ampliando a obra com a organização de novos pontos de pregação e
congregações. Morreu trinta anos antes de Daniel, quando faltava um mês e meio
para completar 54 anos.
“A mensagem completa do evangelho”
Os missionários evangélicos do século
19 foram, em parte, beneficiados pela chamada pré-evangelização, realizada pela
Igreja Católica Romana nos 300 anos anteriores à sua chegada ao Brasil (de 1549
a 1855). Os missionários pentecostais foram muito beneficiados pela
evangelização realizada pelos missionários evangélicos nos 55 anos anteriores
ao início de seu trabalho (de 1855 a 1910). Em alguns poucos casos, o trabalho
das Assembleias de Deus começava com a pentecostalização de uma igreja
evangélica já existente, como aconteceu com a Igreja Batista Sueca de South
Bend, no início de 1910. Em outros casos, começava com alguns crentes que
deixavam suas congregações de origem para abraçar a “novidade” pentecostal. Foi
o que aconteceu em Belém do Pará e em muitos lugares por esse Brasil afora,
especialmente nos primeiros anos. Todavia, a maior parte da membresia das
Assembleias de Deus procedia das trevas da ignorância religiosa e das trevas do
pecado e da incredulidade.
Gunnar Vingren, Daniel Berg e a
geração de pastores nacionais que surgiu com eles não anunciavam apenas Jesus.
Pregavam “a salvação em Jesus e o batismo com o Espírito Santo”. Esta era “a
mensagem completa do evangelho”. Tal pregação certamente encontrava guarida
entre os cristãos que, à semelhança dos discípulos de Éfeso, nem sequer sabiam
da existência do Espírito Santo (At 19.2), por culpa da omissão de seus
pastores. Encontrava guarida também entre os cristãos cujos pastores atribuíam
toda honra ao Espírito Santo sem, contudo, usar a nomenclatura teológica dos
pentecostais.
O folheto de 27 páginas de Raimundo
Nobre
Por certo período houve muito
desgaste emocional e de tempo por causa do atrito entre as denominações
plantadas na segunda metade do século 19 e as Assembleias de Deus. Houve
atitudes precipitadas, exageros e falta de amor de ambas as partes. O
encarregado da congregação batista de Belém, Raimundo Nobre, acolheu os dois
suecos no porão de sua casa e permitiu a participação deles nos cultos, o que
redundou na divisão da igreja. Aborrecido e preocupado com a situação, Raimundo
escreveu um folheto de 27 páginas contra a pregação de Gunnar e Daniel, e
mandou imprimir 20 mil exemplares, que foram enviados para as igrejas
evangélicas de todo o Brasil. Gunnar ensinava que a prova do batismo com o
Espírito Santo era falar em línguas. Anos depois, a declaração de fé oficial
das Assembleias de Deus amenizou a questão, afirmando que falar em outras
línguas conforme a vontade soberana de Deus é evidência do batismo com o
Espírito. Da parte dos pentecostais, havia muita ênfase em línguas, revelações,
curas e milagres. Daniel chamou de milagre o fato de um peixe ter pulado para
dentro do barco quando os passageiros estavam com muita fome.
Cem mil batizados em 36 anos
A primeira igreja pentecostal foi
organizada há exatos cem anos, em 18 de junho de 1911, seis meses depois da
chegada dos dois suecos ao Pará, com o nome de Missão da Fé Apostólica, o mesmo
nome dado por William Seymour à igreja da rua Azuza, em Chicago, cinco anos
antes. O nome Assembleia de Deus foi adotado seis anos e meio depois, em
janeiro de 1918.
Nenhuma denominação evangélica
experimentou um crescimento tão rápido e tão grande como as Assembleias de
Deus. Nos quatro primeiros anos (1911-1914) houve 384 batismos “nas águas”. No
final da primeira década, a nova denominação estava estabelecida em sete
estados das regiões Norte (Pará e Amazonas) e Nordeste (Ceará, Rio Grande do
Norte, Paraíba, Pernambuco e Alagoas). Na década de 20, os assembleianos
ocuparam os demais estados do Norte e Nordeste e começaram o trabalho nas
regiões Sudeste (Espírito Santo, Rio de Janeiro e Minas Gerais) e Sul (Paraná e
Rio Grande do Sul). Em 33 anos de história (de 1911 a 1944), já estavam
instalados em todos os estados da Federação. Na ocasião da 8ª Convenção
Nacional das Assembleias de Deus, realizada em São Paulo, em 1947, o Brasil já
era contado como o terceiro país em número de crentes pentecostais em todo o
mundo, com 100 mil fiéis batizados.
fonte ultimato.com
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