Parábola das duas casas (Mt 7:21-28)
Nessa
parte do discurso do Senhor, ele fala de sua própria divindade —"Senhor,
Senhor" (Mt 7:21; Jo 13:13)— e, como divino, exige a nossa
obediência irrestrita. Dizer que ele é o Senhor e não reconhecê-lo de fato como
tal, dentro de si, impedirá que Cristo o reconheça tanto agora como em sua
vinda. Isso sabemos com certeza que ele realmente conhece os
que são seus (2Tm 2:19). Ao terminar o seu discurso, Jesus disse:
"Portanto todo aquele que ouve essas minhas palavras, e as pratica, será
semelhante ao homem prudente". Então prossegue e refere-se ao que esse
homem obediente, astuto e prudente faz. Constrói a sua casa, toda a sua vida,
sobre as rochas do verdadeiro discipulado, uma submissão genuína a Cristo. O
homem desobediente constrói de maneira diferente.
Rocha
por fundamento. Cristo, ele próprio, é a Rocha sobre a
qual construímos. "Sobre esta pedra", i.e., sobre a sua divindade que
Pedro confessara, "edificarei a minha igreja" (Mt 16:18; Dt 32;
Sl 18:2,46; 1Co 3:10,11; Sl 46:1,2). Esse salmo tem sido chamado a Canção
da casa sobre a rocha, que não temia quando vinham as tormentas. Por toda a parábola que estamos analisando, Cristo
ensina a importância do fazer tanto quanto doouvir. Em
sua descrição dos dois construtores, deixou claro que foram julgados, não pelo
cuidado que tiveram ao construir suas casas, mas pelo fundamento sobre o qual elas estavam.
Ele ilustrou de forma notável a importância do fundamento ao edificarmos a
vida. Se desejarmos construir mansões mais imponentes para a alma, os
fundamentos devem ser cuidadosamente escolhidos.
A
interpretação da parábola, sem dúvida, sugerida pela arquitetura que estava ao
redor deles, está relacionada com "o material em geral de uma vida cristã
externa", uma vida que se apóia e está arraigada em tudo o que o Senhor é:
em si mesmo. É somente pela nossa união com Cristo, a Rocha, que podemos conseguir
a firmeza da parede, sem a qual até mesmo os nossos objetivos mais firmes serão
como areia movediça. Temos segurança eterna, se formos edificados sobre
aquela fundação a respeito da qual Deus disse: "Vede, assentei em Sião
uma pedra, uma pedra já provada, pedra preciosa de esquina, que está bem firme
e fundada" (Is 28:16). Lucas refere-se ao construtor sábio, dizendo
que ele "cavou, e abriu bem fundo, e lançou os alicerces sobre a
rocha" (Lc 6:48). O caro Benjamin Keach diz o seguinte
sobre o cavar fundo: "A alma do crente cava fundo, penetrando na natureza
de Deus, para descobrir qual o tipo de justiça em que achará alívio e se
harmonizará com a justiça e a infinita santidade de Deus".
Areia
por fundamento. Cristo sabia que os estrangeiros, os
quais vinham à Galiléia para construir, eram atraídos para um solo
de areia, já pronto para ser usado, não para a rocha dura e enrugada do local.
Mas, quando vinha o tempo das chuvas fortes, só restava ao construtor um monte
de ruínas. O que uma fundação arenosa representa? Denota um fundamento frouxo,
o ato de professar a religião de forma vazia, mera religião externa. Ellicott comenta
que a "areia" explica "os sentimentos inconstantes e incertos
de alguns homens (os 'insensatos' da parábola), o único solo sobre o qual agem
—amam ser louvados, são fiéis aos costumes e assim por diante". A segunda
casa, embora muito impressionante, não tem fundação e, portanto, está
condenada à destruição. Que grande diferença nosso Senhor retrata aqui! Como
estão em perigo os homens cujas decisões não se baseiam na ajuda de Deus,
encontrada pela oração; cujas alegrias não são baseadas na confiança do amor
de Deus; cuja confiança não é baseada na presença revelada de Deus; cujas
virtudes não têm raízes; cuja bondade não tem motivação; cuja esperança não
tem fundamento! A casa de tal homem está simplesmente com as suas partes
ligadas umas às outras, e pode cair a qualquer momento. Os fariseus do tempo
de Cristo construíram suas esperanças em bênçãos e privilégios externos:
"Temos Abraão por pai" (Lc 3:8; Jo 8:33). Mas o coração deles
estava distante da Rocha de sua salvação, e Cristo teve de dizer-lhes que o
diabo é que era o pai deles, não Abraão.
Edificadores. Nosso Senhor usa edificadores "prudentes"
e "insensatos" para se referir a duas classes de pessoas, por meio
da imagem natural da construção de uma casa. Podemos entender pelo quadro
nítido que ele desenhou ambas as casas: atraentes e sólidas; mas Jesus revela
a firmeza delas. O material usado e o processo de construção estavam corretos
quando foram erguidas, e ambas pareciam no prumo certo, firmes e fortes.
A
vida não é mais que "construir o caráter, os hábitos, as lembranças, as
expectativas, tanto de fortalezas como de fraquezas; ao construirmos a casa da
vida, adicionamos uma coisa sobre a outra, como se fosse pedra sobre pedra.
Nosso desejo é que a construamos de forma segura". Há boas pessoas, que
não são do Senhor, que constroem bem e acham que suas casas estão edificadas
bem e sabiamente sobre o dinheiro, os amigos, a saúde, o sucesso nos negócios
—todas essas coisas são louváveis em si mesmas, mas são desastrosas, se
não forem alicerçadas sobre a Rocha. Mas há outros que constroem de maneira
diferente, "aumentando diariamente o seu poder em servir, o seu
conhecimento de Deus, as suas vitórias sobre os seus defeitos, as suas
alegrias e esperanças, até que suas vidas se tornem um palácio digno para Deus
habitar".
Elementos
do teste. As chuvas torrenciais, as inundações e
os furacões do Oriente causam muitos danos às casas de aparência fortes,
destruindo as não solidamente construídas —essa foi uma ilustração
que nosso Senhor usou com muita propriedade. "Desceu a chuva" Jesus
compara aos momentos de prova apavorantes, às forças concentradas de uma chuva
torrencial que ameaça o telhado da casa. Como dá medo a chuva que cai, seguida
de uma ventania!. "Transbordaram os rios", e essas torrentes
tempestuosas podem corroer as paredes por baixo. "Sopraram os
ventos", e esses ventos impetuosos como de furacão ameaçam os lados da
casa.
Essas
forças naturais aliadas fazem lembrar que o sol de verão nem sempre brilha.
Não faz diferença se somos "prudentes" ou "insensatos",
todos temos tensões, aflições, decepções, perdas, tentações, temores e
pensamos sobre a morte e a vida no além. Ellicott diz: "O vento, a chuva e
as inundações não dão folga para a interpretação individual, a
não ser que se use um detalhismo exagerado. Esses elementos
representam coletivamente as violências da perseguição, do sofrimento e das
tentações, sob as quais tudo, exceto a vida que repousa sobre a verdadeira fundação,
cederá".
Um
toque dramático é acrescentado ao desastre que sobreveio à casa construída
sobre a fundação de areia —"E foi grande a sua queda". Com essas
palavras lamentáveis, Cristo adverte a que evitemos destino semelhante. Como
deve ter sido impressionante essa imagem de terrível ruína para os que o
ouviam, pois estavam acostumados à ferocidade das tempestades do Oriente, e
como repentinos e absolutamente varriam tudo à sua frente que não estivesse
firme! Não é de admirar que, quando Jesus terminou o discurso parabólico, as
pessoas estavam maravilhadas com a singularidade e autoridade de suas
palavras. "A consciência de ser a autoridade divina como legislador,
comentarista e juiz brilhavam por sua mensagem, de tal forma que o ensino dos
escribas ficou reduzido a nada mais que salivação debaixo de tanta luz."
Os escribas eram meramente varejistas daquilo que outros haviam dito. Quando
falamos do que sabemos, porque já experimentamos algo em nosso coração, então
também, como o Mestre, falamos com autoridade.
Os
construtores insensatos deveriam prestar atenção à advertência de Jesus, e
construir novamente, agora sobre uma fundação sólida, i.e., nele (1Co 3:11).
Antes que uma perda final e irreparável lhes sobrevenha, serão sábios para
reconhecer a sua absoluta impotência uma vez separados da graça, construindo sobre
a única fundação segura, do arrependimento e da fé, em tudo o que Deus prove
para a sua redenção.
Bibliografia H. Lockyer,COMENTARIO BIBLICO NOVO
TESTAMENTO
Uma parábola
ilustrativa (7:24-27)
Qual pode ser a utilidade do fervor
religioso, se o indivíduo não se encontra com Cristo por seu intermédio? Nenhuma, responde
o evangelista. Isso ele ilustra com a parábola dos dois alicerces. A religião,
por si mesma, se é símplice, não pode servir de alicerce sólido. A nossa
conduta moral, o nosso misticismo, as nossas orações, os nossos estudos, a
nossa meditação, o uso que fizermos dos dons espirituais, tudo deve
conduzir-nos a Cristo, pois, do contrário, nada serão.
7:24 Todo aquele, pois, que ouve estas minhas palavras e as põe em prática,
será comparado a um homem prudente, que edificou a sua casa sobre a rocha.
(Lc 6:46-49). ALGUNS dos antigos códigos
legais (Lv 26:3-45; Dt 28:3-6, 16-19) terminavam com bênçãos e
maldições. Ideias similares são apresentadas em Aboth R. Nathan: «O
homem que tem obras e que aprendeu muito da Torah, com o que pode
ser comparado? Ao homem que edifica embaixo com pedras, e em cima com
tijolos; e quando muita água cerca o edifício, as pedras não se abalam nem são
tiradas de seu lugar. Porém, o homem que não tem boas obras e nem aprendeu a Torah,
com quem pode ser comparado? Ao homem que constrói primeiramente com
tijolos, e em cima com pedras, e quando chega até mesmo uma correnteza pequena,
as pedras imediatamente caem».
Jesus usa aqui uma ilustração que
também pode ser encontrada nos escritos dos judeus. Essa ilustração poderia ter
sido muito instrutiva para uma audiência oriental, afeita às—tempestades
características—da região: violentas, repentinas, que às vezes provocavam
grande destruição. Chuva no telhado, um rio nos alicerces, vento nas janelas,
exigiam uma construção firme, com bons alicerces.
«Ouve estas minhas palavras».
Jesus faz aqui *a aplicação* do sermão. Esta seção (vss. 24-27) é o epílogo do
sermão. Provavelmente Jesus usou essas palavras em outras circunstâncias,
noutros sermões, para mostrar a necessidade que o povo tinha de receber o
Cristo do reino. Diversos indícios mostram que ele não se referiu só ao reino
literal, sobre a terra, o reino político, mas também aludiu ao reino dos céus,
à salvação, ao destino dos seres humanos. Para que alguém alcance esse destino
e o reino dos céus, os lugares celestiais, é mister que ouça e
pratique as palavras do Rei.
«Ouve... pratica». Esses dois aspectos sempre andam juntos (ver Tg 1:22-25).
Nesse ponto é que falhavam os falsos profetas. É o que os discípulos falsos
apenas fingiam fazer. E é isso que os discípulos autênticos devem fazer.
«Homem prudente». O homem sem bom senso se deixaria impressionar pelo terreno nivelado,
sem rochas, que não precisasse de preparo, como se já estivesse pronto para
receber a construção. Mas a areia é traiçoeira. Em contraste, o prudente
pensaria no futuro, nos ventos, nas inundações. Escolheria terreno
pedregoso, apesar de tal terreno requerer muito preparo e trabalho, para que a
casa começasse a ser edificada. Este homem prudente simboliza os que ouvem
e praticam os ensinos de Jesus. Não faltariam a tal homem as tempestades e os
períodos de dificuldade, mas no fim o resultado justificaria sua decisão na
escolha do terreno. Esse é o homem que considera bem o ensino, aprende-o e
torna-o regra de vida.
«Sua casa». Não visava a ostentação, mas tinha por finalidade ficar
firme, em meio às tempestades. A casa é o símbolo da vida. A vida deve ser
edificada com bom senso, considerando o futuro, e não apenas o presente, de
acordo com os princípios ditados por aquele que dá a vida e a sustenta. A vida
física deve ser usada para obter e desenvolver a vida eterna.
«rocha». Provavelmente Jesus se refere a si mesmo e aos seus discípulos
verdadeiros. A alusão é à terra rochosa, pedregosa, que serve de bom alicerce
para as edificações. Mas, na aplicação simbólica dessas palavras, não há que
duvidar que Jesus falou de si mesmo. Jesus é quem tem as palavras da
vida eterna, porquanto ele é o pioneiro e o consumador da fé, o caminho e a
vida (Jo 14:6). Portanto, ele é a rocha (I Co 10:4; II Sm 22:2; Sl
23:3; 28:1; 30:3; Is 26:4; I Co 3:11). O ensino é que a vida deve
estar—inteiramente—vinculada, edificada e envolta em Cristo.
7:25 E desceu a chuva, correram as torrentes, sopraram os ventos, e bateram
com ímpeto contra aquela casa; contudo não caiu, porque estava fundada sobre a
rocha.
«VENTOS», «chuvas», «rios», isto é,
«turbulência» por cima, ao redor e por baixo dos alicerces. Diversos
intérpretes fazem desses símbolos de turbulência, comparações com as tentações,
com os «dolores Messiae», com as perseguições, com as heresias na igreja,
etc. Outros ensinam que estão subentendidas três provas diversas, como: 1.
Chuva: as aflições temporais; 2. rio: as provas que resultam do
maltrato por parte de outros homens; 3. vento: as tentações e as provas
que se originam em Satanás ou nos demônios. Provavelmente Jesus falou em termos
gerais, que incluem essas ideias, mas sem fazer referência exata ou
intencional a essas coisas.
«não caiu». Os pais da igreja aplicavam
essas palavras—à própria igreja, como edifício de Cristo, e nisso encontravam o
cumprimento de suas palavras: «Edificarei a minha igreja, e as portas do
inferno não prevalecerão contra ela» (Mt 16:18). Isso é verdade, sendo
possível que esteja subentendido nas palavras de Jesus, mas a principal
interpretação é a da vida individual. As pessoas que realmente têm a Cristo
como fundamento e edificam uma vida de discipulado autêntico sobre ele,
alcançarão o destino desta vida.
7:26 Mas todo aquele que ouve estas minhas palavras, e não as põe em prática,
será comparado a um homem insensato, que edificou a sua casa sobre a areia.
«OUVE... não pratica... casa sobre
a areia». Nota-se que realmente a ideia principal não é a de dois fundamentos,
porque a areia não é fundamento. Aquele que edifica sobre a areia não tem
alicerce algum; ignora essa necessidade. A experiência humana mostra que muitos
se alicerçam em coisas sem a aprovação de Deus, e muitos outros não têm base de
espécie alguma. Ambos os tipos ignoram a maior necessidade, o alicerce na
rocha. Os cães e os porcos do vs. 6 exemplificam aqueles que não têm alicerce.
Os fariseus (os hipócritas de 6:5 e de outros versículos), os falsos
profetas (dos vss. 15-20), os discípulos e autoridades falsas (dos vss.
21-23), são exemplos de pessoas com alicerces falsos. Todos esses são «insensatos».
Essa palavra é dura, pois é palavra que Jesus proibiu de ser aplicada aos
outros (Mt 5:22). O seu—sentido principal—é embotado, pesado, estúpido. Era
termo empregado para dar a entender uma comida sem sabor. Todos esses sentidos
podem ser aplicados à alma e à mente do homem que ouve mas não
pratica os ensinos de Jesus.
7:27 E desceu a chuva, correram as torrentes, sopraram os ventos, e bateram
com ímpeto contra aquela casa, e ela caiu; e grande foi a sua queda.
NOTEMOS que este pode passar pelas
primeiras provas do primeiro homem, mas com resultado diferente. «Sendo
grande a sua ruína».Jesus deixa novamente subentendido o juízo, a perda do
destino da vida, a razão mesma da existência.
Lemos que ocasionalmente, durante a
seca do ano, os pescadores erigiam cabanas sobre a areia que secara com a falta
de água. Quando, repentinamente, voltavam as chuvas, causando
inundações inesperadas, essas cabanas eram destruídas totalmente, num momento.
Assim ocorre àquele que ignora o alicerce na rocha. Entre os escritos
judaicos encontramos as seguintes palavras do rabinoEleazar, as
quais ilustram bem a mensagem sobre os dois fundamentos: «O homem cujo
conhecimento excede às suas obras é como a árvore de muitos galhos mas poucas
raízes; ao soprar o tufão, tal árvore é arrancada da terra e destruída. Mas
aquele que tem mais obras do que conhecimento, com que podemos compará-lo? Ele
é como a árvore que tem poucos ramos e muitas raízes; assim sendo, todo o vento
dos céus não podem tirá-la do lugar». Outros rabinos empregaram parábolas mais
semelhantes às que encontramos neste evangelho de Mateus.
Bibliografia R. N. Champlin,COMENTARIO DO NOVO TESTAMENTO,1982
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